Prof. Renato Las Casas (20/07/2000)
A questão "água líquida na superfície de um planeta" se confunde com a questão "vida no planeta". Pelo que acreditamos, a presença de água líquida na superfície de um planeta não apenas é condição necessária, como também é um elemento "forte", em favor do desenvolvimento de vida nesse planeta.
À medida que a "exploração" de Marte avança, vamos descobrindo novas evidências, da presença de água em sua superfície. A sonda "Mars Global Surveyor" (MGS) pouco depois que entrou em órbita de Marte, em dezembro de 98, não apenas obteve dados que confirmam a presença atual de água sólida e de vapor d'água na superfície desse nosso vizinho, como também reforçou a idéia da presença passada de grandes quantidades de água líquida em sua superfície. Recentemente (22/06/2000) a NASA publicou novas imagens obtidas pela MGS que sinalizam a presença de água no sub-solo marciano. Parte dessa água, esporadicamente fluiria por sua superfície nos dias atuais.
Imagem obtida pela MGS (1999). As formações fotografadas parecem corresponder a rios e lagos antigos
Termodinâmica é a parte da física que estuda o fluxo de calor entre os corpos e os seus efeitos. Segundo a termodinâmica, água pode ser encontrada estável na superfície de Marte apenas como gelo ou vapor. Pode até existir água líquida na superfície de Marte, porém em locais muito específicos e durante intervalos de tempo muito curtos. Se de alguma maneira colocássemos uma certa quantidade de água líquida em Marte, essa água líquida rapidamente se transformaria em gelo ou vapor, dependendo do local onde a colocássemos.
Isso acontece devido principalmente à baixa pressão atmosférica na superfície de Marte (6 milibars; cerca de 0,6% da pressão atmosférica na superfície da Terra); assim como à sua baixa temperatura (-60 graus Celsius em média)....
Imagem obtida pela MGS (1999). Ao alto vemos a Calota Polar Norte de Marte. As calotas polares marcianas são formadas por uma mistura de gelo de água (H2O) e "gelo seco" (CO2). Podemos observar também várias nuvens espalhadas por quase toda a atmosfera do planeta. Essas nuvens são formadas por "gelo de vapor d'água". Nessa foto merece destaque um imenso ciclone bem próximo à calota polar. Em geral, quanto maior um ciclone, maior a pressão em seu interior. Haveriam, no interior desse ciclone, as condições físicas necessárias para a presença de água líquida? Haveria ciclo da água em Marte?
Em junho passado a NASA publicou uma série de imagens obtidas pela MGS que nos levam a crer que em um passado recente água fluiu pela superfície de Marte. Essas imagens são todas de encostas de crateras ou de vales que se situam entre as latitudes 30o e 70o (norte ou sul) e com uma outra "coincidência": todas essas encostas estão voltadas contra o equador marciano ("de costas" para o Sol).
Imagem obtida pela nave Viking (1978). Vemos, cortando a imagem na diagonal, um canal situado no "Nirgal Vallis". Esse canal deve ter sido formado por água corrente há centenas de milhões de anos. Antes das últimas imagens publicadas pensava-se estar esse canal, assim como toda a superfície de Marte, constantemente seco. Parte da encosta do canal, fotografada pela MGS, está marcada com um retângulo. Note que as sombras estão projetadas para a parte inferior da imagem (o Sol ilumina a partir da parte superior da imagem). Essa região se encontra no hemisfério sul e tanto essa imagem como a próxima estão orientadas com o norte para cima.
Imagem MGS (2000). Repare nas dunas que se encontram na parte inferior da fotografia (no fundo do canal). Essas dunas foram formadas recentemente. A prova disso é que não existem marcas de impactos (crateras) sobre elas. Repare que sobre algumas dessas dunas (as que se encontram mais próximas à encosta do canal) foi depositado material trazido por "regos" que "descem" pela encosta do canal. O processo de movimento desse material e abertura desses regos por golfadas de água que surgem na parte mais alta da encosta será explicado abaixo.
Imagens de uma pequena cratera (10km de diâmetro) localizada na "Elysium Planitia". À esquerda imagem Viking (1978) e à direita imagem MGS (2000). Nessa última, note que o Sol ilumina a cratera a partir da parte inferior da imagem. Essa cratera se encontra no hemisfério norte e as fotografias estão orientadas com o norte para cima.
Imagem MGS (2000). Aqui a fotografia foi girada, ficando o norte à esquerda. Na imagem de cima aparecem demarcadas as duas regiões mostradas em detalhes abaixo. Note a diferença entre a parede da cratera voltada contra o Sol (parede sul) e a parede voltada a favor do Sol. Na primeira vemos uma estrutura de regos como aqueles encontrados no "Nirgal Vallis"; na segunda vemos uma estrutura comum a quase todas as encostas marcianas.
A análise dessas imagens (e outras mais de cento e cinqüenta) levou à formação do seguinte modelo para explicá-las:
Diagrama comparando teoria e observação