Prof. Renato Las Casas (03/novembro/2010)
No início de outubro foram divulgados os nomes dos ganhadores dos “Prêmios Nobel 2010”.
De todos, o nome mais conhecido talvez seja o do britânico Robert Edwards, apelidado “o pai do bebê de proveta”. Ele ganhou o Nobel de Medicina. O dissidente chinês Liu Xiaobo, atualmente encarcerado pelo regime de seu país, ganhou o Nobel da Paz. O Nobel de Química foi dividido entre o norte americano Richard Heck e os japoneses Ei-ichi Negishi e Akira Suzuki, por seus trabalhos relativos a reações do carbono.
O Nobel de Física foi ganho pelos russos André Geim (52 anos) e Konstantin Novoselov (36 anos) por seus experimentos inovadores com o material grafeno.
O grafeno é uma folha de carbono com a espessura de um único átomo (o único material bidimensional que conhecemos). Por ter a espessura de um único átomo, podemos pensar que é frágil; mas não é. O grafeno é extremamente resistente. Uma folha desse material estendida sobre a borda de um copo, por exemplo, seria capaz de suportar o peso de um automóvel sobre uma área equivalente à ponta de um palito de fósforo. Ele também é transparente à luz visível e é tão denso que nem mesmo o menor dos átomos gasosos, o hélio, consegue atravessa-lo. Como se não bastasse, o grafeno possui características elétricas e térmicas muito especiais. Conduz eletricidade tão bem quanto o cobre e conduz calor melhor que qualquer outro material conhecido. E se você pensa que esse é um material caro, difícil de ser encontrado na natureza e/ou produzido, errou! O grafeno é uma folha unidimensional de grafite. Pequeníssimas folhas de grafeno são liberadas na folha de papel quando você escreve com lápis.
Isso tudo faz com que o grafeno venha sendo considerado o “material do futuro”. Espera-se que em poucos anos esse material torne-se muito presente no nosso dia a dia, com aplicações desde a construção civil (no preparo de massas para concreto, por exemplo) até à eletrônica (substituindo o silício nos transistores; na fabricação de telas de computadores; etc.).
Konstantin Novoselov, realizou pós-doutorado na Radboud University Nijmegen, na Holanda, em 2004, sob orientação do André Geim. Em outubro daquele ano os dois publicaram na Revista Science o artigo “Electric Field Effect in Atomically Thin Carbon Films”; onde relatam seus experimentos com o grafeno e suas conclusões. Logo depois Geim se transferiu para a Universidade de Manchester, na Inglaterra, onde trabalha até hoje, e Novoselov o acompanhou. O trabalho de Geim e Novoselov não apenas demonstrou e explicou algumas das propriedades do grafeno, como também descobriu métodos práticos para a sua obtenção na forma de pequenas folhas.
E os sapos? Qual a relação entre eles e o grafeno?
- A relação é o André Geim.
Você já ouviu falar no “Ig Nobel”? Esse é o nome de um premio, organizado pela revista norte americana de humor científico “Annals of Improbable Research”. O Ig Nobel, que faz paródia ao Nobel, é concedido a pesquisadores cujos trabalhos “fazem as pessoas rir e depois pensar”. A cerimônia de premiação é realizada no inicio de outubro de cada ano na Universidade de Havard (EUA).
André Geim, ainda trabalhando na Universidade de Nijmegen, ganhou o Ig Nobel de 2000, juntamente com Michael Berry, da Universidade de Bristol, por fazerem um sapo vivo (e outros objetos, separadamente) levitar na presença de um campo magnético.
André Geim é o único laureado tanto com o Nobel quanto com o Ig Nobel (pelo menos até outubro de 2011).
Fazer um sapo levitar na presença de um forte campo magnético serviu para Geim e Berry confirmarem que o teorema de Earnshaw (que diz não ser possível haver equilíbrio estável num sistema com forças eletrostáticas ou magnéticas que variem com o inverso do quadrado da distância) não se aplica ao magnetismo induzido. Se você aplica um campo magnético sobre um determinado material, esse material vai reagir ao campo aplicado, criando um campo magnético próprio, ao qual denominamos campo magnético induzido. Nem todo material reage da mesma forma à presença de um campo magnético.
Materiais ferromagnéticos são aqueles que se imantam fortemente sob a ação de um campo magnético, gerando um campo induzido na mesma direção do campo aplicado, porém muito mais intenso. Materiais ferromagnéticos são fortemente atraídos pelos imãs. São ferromagnéticos apenas o ferro, o cobalto, o níquel e as ligas formadas por essas substâncias.
Materiais paramagnéticos também reagem à presença de um campo magnético “criando” um campo magnético induzido também na mesma direção do campo indutor, porém de baixa intensidade. Materiais paramagnéticos são fracamente atraídos pelos imãs. São materiais paramagnéticos: o alumínio; o magnésio; o sulfato de cobre; etc.
Já os materiais diamagnéticos reagem à presença de um campo magnético, criando um campo magnético induzido no sentido contrário ao do campo indutor e muito mais fraco que esse. Como se o próprio material se transformasse em um fraco imã oposto ao indutor. Como conseqüência, materiais diamagnéticos são “fracamente” repelidos por imãs. São substancias diamagnéticas: a grafite; o bismuto; o chumbo; o cobre; o ouro; a prata; a água; etc.
Levitação diamagnética já é conhecida desde 1939, quando pequenas esferas de grafite e bismuto foram levitadas em um forte eletroímã. A repulsão entre o campo magnético indutor e o campo magnético induzido nos materiais diamagnéticos anula a força peso desses corpos. No final dos anos 80, alguns físicos em Grenoble (França) levitaram vários materiais orgânicos. Apesar desse trabalho haver sido publicado em uma revista de grande circulação (Nature) ele passou desapercebido, segundo André Geim, até mesmo de grande parte dos físicos, que constantemente se surpreendiam quando ouviam a afirmativa que água poderia ser levitada diamagneticamente. Um sapo, ou qualquer outro corpo que contenha água em sua constituição, pode assim levitar.
Mas porque realizar o experimento com um sapo? O próprio André Geim explica:
- “Levitamos um sapo vivo (e outros objetos não muito convencionais cientificamente) por causa de seu óbvio apelo a um publico mais amplo e na esperança de que pesquisadores de várias disciplinas, não apenas os físicos, nunca esqueçam essa força (diamagnética), muitas vezes negligenciada, e as oportunidades que ela oferece”.
O trabalho de Geim e Berry, intitulado “Of Flying Frogs and Levitrons” foi publicado em 1997 na Revista “European Journal of Physics”.