= ou: falando sobre os bósons de Higgs; mini-buracos negros e big bangs =
Prof. Renato Las Casas (31/maio/2010)
O Grande Colisor de Hádrons (ou LHC, como é mundialmente conhecido pelas suas iniciais em inglês) foi inaugurado com grande expectativa em setembro de 2008. Ainda estava em fase de ajustes quando problemas de superaquecimento o danificaram nove dias após inaugurado. Voltou a funcionar em novembro de 2009, atingindo sua meta de colisão de prótons acelerados em sentidos opostos com energias recorde de 7 Tev (tera eletron volts), em 30 de março passado.
O LHC é uma imensa e sofisticada máquina onde as partículas são aceleradas em um túnel (localizado na fronteira da França com a Suíça) que fica “enterrado” a 100 metros de profundidade e tem a forma de um anel com 27 km de circunferência. As partículas são aceleradas por campos elétricos e “guiadas” por campos magnéticos (Campos elétricos dão energia para partículas carregadas enquanto campos magnéticos desviam as trajetórias dessas partículas).
As colisões entre as partículas são planejadas para acontecerem em quatro pontos específicos, onde estão localizados os quatro detectores do LHC. O Atlas, mostrado na foto abaixo, e o CMS (iniciais de “Compact Muon Detector”), são detectores genéricos, capazes de detectar inúmeros tipos de partículas; até mesmo partículas desconhecidas. Os outros dois detectores (LHCb e ALICE) são “dedicados” a partículas bem específicas.
Colisões a essas energias podem “criar” certas partículas previstas teoricamente mas jamais observadas. Essas partículas, caso detectadas, podem nos dar informações sobre o que acreditamos ser o “mais íntimo da matéria”, nos ajudando inclusive a entender os instantes iniciais do Universo, onde algumas delas exerceram papel preponderante no mecanismo “das coisas”. Quando se “quebra” prótons, jogando-os um contra o outro com velocidades próximas à velocidade da luz, acreditamos que podemos “criar” um “mini universo” (na realidade “ínfimo universo”), semelhante ao universo real cerca de um nano segundo após o Big Bang.
Cientistas de todo o mundo, participantes do projeto, estão procurando por possíveis “rastros” deixados por essas, até então, hipotéticas partículas nos detectores do LHC. Esse, porém, é um trabalho lento e minucioso que pode levar anos para ser concluído. Os trabalhos estão se concentrando principalmente na tentativa de identificação de uma partícula denominada “bóson de Higgs” (chamada “partícula de Deus” pela imprensa de todo o mundo). Em 1964 o professor escocês Peter Higgs sugeriu a existência dessa partícula que teria sido a responsável pela conversão da matéria inicialmente criada no Big Bang na massa que conhecemos hoje.
Os Bósons são uma das duas classes de partículas que acreditamos constituírem o universo (à outra classe chamamos férmions). Seria muito extenso explicar detalhadamente essas duas classes; porém, em linhas gerais, podemos dizer que elas se distinguem por simetria ou anti-simetria de seus atributos físicos. Como consequência, cada classe possui características próprias. Por exemplo: todas as partículas que possuem massa são férmions. Se alguns férmions vão, ou não, se combinar para dar origem a esse ou aquele corpo, isso dependerá das interações entre eles (força gravitacional; eletromagnética; fraca ou forte). Os bósons são as partículas responsáveis por essas interações (os bósons seriam como que mensageiros que levariam ordens de um férmion a outro).
Isolada do universo, nenhuma partícula teria massa. Apesar de todo o avanço científico, ainda não sabemos exatamente por quê (ou como) as massas das partículas surgiram. Segundo Peter Higgs (que na foto abaixo aparece no túnel do LHC), os “bósons de Higgs” seriam os responsáveis pela “materialidade” do universo.
É possível que mini-buracos negros estejam sendo criados no LHC.
Buraco negro é uma região do espaço onde o campo gravitacional é tão forte que nada sai dessa região, nem a luz. O que cria campo gravitacional é massa. Para se criar um campo gravitacional forte o suficiente para não deixar nem a luz escapar, a quantidade de massa não é fundamental. O que é fundamental é a densidade em que essa massa se encontra. Mesmo massas ínfimas podem dar origem a buracos negros, desde que essas massas estejam altamente concentradas. O tamanho de um buraco negro vai depender da quantidade de massa que lhe dá origem. Massas ínfimas altamente concentradas darão origem a buracos negros de dimensões também ínfimas.
Se a partir da superfície de nosso planeta atirarmos um corpo para cima, dependendo da velocidade com que atirarmos esse corpo, ele irá escapar do campo gravitacional criado pelo nosso planeta e não retornará a ele.
A velocidade mínima para isso acontecer é chamada velocidade de escape. A velocidade de escape na superfície da Terra é 40.320 Km/h. Na superfície da Lua, onde a gravidade é mais fraca, é 8.568 Km/h, e na superfície gasosa do gigantesco Júpiter é 214.200 Km/h.
A velocidade da luz é aproximadamente 1.080.000.000 Km/h. Um buraco negro é um corpo que produz um campo gravitacional forte o suficiente para ter velocidade de escape superior à velocidade da luz. A Teoria da Relatividade de Einstein nos mostra que nenhum corpo que tem massa pode chegar a essa velocidade; consequentemente, se a velocidade de escape em uma certa região do espaço for superior à velocidade da luz, nada escapa dessa região.
A massa do Sol, 2,0 X 1030 (corresponde ao 2 seguido de trinta zeros) Kg, é 333 mil vezes a massa da Terra, e seu diâmetro (1,4 milhões de quilômetros) é mais de 100 vezes o diâmetro da Terra. O Sol se transformaria em um buraco negro caso se contraísse a um diâmetro menor que 6 Km.
Até mesmo um grãozinho de areia poderia se transformar em um buraco negro desde que se contraísse a um volume pequeno o suficiente para que a velocidade de escape nas suas proximidades (falando aqui de dimensões sub atômicas) fosse maior que a velocidade da luz.
Teoricamente, existe uma massa mínima possível para um buraco negro. Um principio da física quântica, que trata de dimensões sub-atômicas, nos diz que nenhuma partícula pode ser perfeitamente localizada no espaço. Como não podemos concentrar massa em uma região menor que essa incerteza permite, temos uma limitação na massa mínima capaz de dar origem a um buraco negro. Essa massa mínima é chamada “Massa de Planck” e corresponde a 2,0 X 10-8 (=0,000.000.02) Kg.
Seria possível criarmos buracos negros em laboratório? Como comprimir objetos até se tornarem buracos negros? Isso não parece nada fácil, além de requerer energias altíssimas. Nas ultimas décadas, entretanto, foram desenvolvidas teorias físicas que supõe a existência de outras dimensões espaciais além das três (largura; altura e profundidade) que até então reconhecíamos. Em escala sub-atômica, essas dimensões extras não apenas aumentariam os raios dos buracos negros como também diminuiriam suas massas. Como conseqüência, mini-buracos negros poderiam ser formados em colisões de partículas sub-atômicas a altíssimas velocidades. Fazendo-se os cálculos, vemos que colisões de prótons a energias de 7 Tev podem dar origem a mini-buracos negros.
Com a inauguração do LHC, foi especulado: Seria esse o fim do mundo? Um mini-buraco negro criado em laboratório que engoliria todo o planeta?
As mesmas teorias que falam da possibilidade de formação de mini-buracos negros à energia de 7 Tev, também nos falam do curtíssimo tempo de vida que esses objetos teriam. Antes que pudessem engolir uma única partícula em suas proximidades, esses mini-buracos negros se “dissolveriam”. Devido à “Radiação Hawking” (teoria elaborada em 1974 pelo físico inglês Stephen Hawking), quanto menor um buraco negro maior a sua taxa de evaporação, consequentemente muito menor o seu tempo de existência.
Desde 30 de março passado, o LHC tem colidido prótons a energias de 7 Tev. É possível que já tenham sido criados milhões de mini-buracos negros nesses primeiros dois meses de funcionamento pleno. Se de fato houve a criação desses objetos, ainda não temos certeza (os dados obtidos pelos detectores do LHC podem demorar anos para serem completamente interpretados). Mas se criados, esses objetos certamente “evaporaram” nos ínfimos intervalos de tempo previstos.