O Zodíaco
Henrique Di Lorenzo Pires (Monitor UFMG/Frei Rosário)
Introdução
É
curioso o
poder
que algumas
palavras tem de
incitar
emoções. “Zodíaco”,
por
exemplo.
Não é
raro
encontrar
quem
não se sinta tentado a
vangloriar
ou
repudiar o
termo. O
vocábulo
causa
reações diversas: do
desdém à
admiração, do místico ao
detestável, do
fantástico ao
repulsivo.
Zodíaco,
que
em
grego (zodiakos) significa “conjunto
de
criaturas” possui
hoje na
astronomia
um
significado
trivial,
bem
diferente do
que o
senso
comum costuma
reivindicar.
Mas
não foi
sempre assim. Historicamente o zodíaco possui um
simbolismo tão forte que influenciou bastante o desenvolvimento da ciência que
hoje conhecemos como astronomia.
Mais
até
que
“zodíaco”,
“astrologia”
assume
um
papel
fundamental
no
desenvolvimento
da
astronomia.
Mas
para
que
a
digressão
histórica
que
estamos
prestes
a
fazer
não
perca
seu
sentido
é
necessário
que
fiquemos
livres
dos
possíveis
preconceitos
ou
empatias
que
a
palavra
costuma
gerar.
A
próxima
seção
é
inteiramente
dedicada a
ela,
em
seguida
discutiremos
um
conceito
importante
para
nossa
compreensão
do
zodíaco,
o
conceito
de
eclíptica,
essencial
em
astronomia.
Finalizaremos o
texto
falando
sobre
esse
“conjunto
de
criaturas”
que
andamos observando
por
aí
– as
criaturas
do
céu.
Astrologia
Poucas
pessoas contribuíram
tanto
com
astronomia
quando
ela estava
em
seus
primeiros
passos
quanto o
astrônomo,
geógrafo e matemático Cláudio Ptolomeu (100-170
d.C.).
Sua
obra, o “Almagesto” influenciou o
desenvolvimento da
ciência
durante
séculos. Algumas
das
suas
observações
já foram citadas
 |
Pintura
medieval simbolizando a
suposta
influência
astral. |
|
em
textos
passados.
Entretanto,
outra
grande
obra
sua é o chamado “Tetrabiblos”, considerada o
mais
importante
tratado
grego
em
astrologia.
Em
sua
introdução Ptolomeu observou
que existem
dois
tipos de
previsões
através da
astronomia – a
primeira,
que foi
tratada no Almagesto,
lida
com o
movimento do
Sol,
Lua e
planetas. O
segundo
tipo de
previsão diz
respeito às mudanças produzidas na Terra pelos
planetas (previsão
que
ele
mesmo considerava
um
pouco incerta,
mas
que de
qualquer
maneira
tentou justificá-la fisicamente).
É
bem
verdade
que
tal
linha de
estudo ganhou
importância e
fama a
partir da Grécia,
mas
isso
não
quer
dizer
que a
origem da
astrologia se deu nessa
época e nesse
local.
Por
volta de 300
anos
antes de
Cristo
estudiosos egípcios “matematizaram” o
conceito de
correspondência
entre o
macrocosmo (o
universo) e o
microcosmo (o
homem), interpretado
em
termos de
filosofia
Platônica
ou
Aristotélica. De
fato, a
astrologia foi introduzida na Grécia
pelos babilônios no
século III
anterior a
Cristo.
Mas
afinal
qual é o
princípio filosófico
básico dessa “ciência”
antiga? (o
porquê de a
palavra
ciência
estar
entre
aspas será explicado
adiante). Os
astrólogos pregavam
que o
cosmo é uma
força
gigantesca
em
que
tudo está interligado.
Eles acreditavam
que a
posição e
movimento dos
astros formavam
um
padrão
que influenciava a
constituição
física e
mental das
pessoas. O
futuro estaria
determinado
nos
céus.
Inicialmente a “profecia”
só
era
válida
para o
governante e
seu
reino, e
isso
era
mais
que
suficiente
para o
aprimoramento das
técnicas astronômicas. Imagine
você
agora:
um
rei
com uma
convicção
profunda de
que é
possível
antever o
destino de
seu
povo (ou
seu
próprio
destino, o
que é
mais
provável...) bastando
para
isso
estudar os
astros. O
que faria? Deixo a
solução
como
um
desafio desnecessário. Matemáticos
geômetras e
astrônomos
concentrados numa
tarefa
árdua de
compreender a
dinâmica
celeste. Examinavam
minuciosamente e sistematicamente os
céus a
fim de
encontrar uma
teoria
geométrica,
um
modelo
satisfatório de
como o
Sol, a
Lua, os
planetas e as
estrelas se comportavam
durante o
tempo e no
espaço. Motivação
para
tanta
obstinação e
teimosia
era a possibilidade
extraordinária de
saber
algo
mais
sobre
que
fatalidade estariam
sujeitos. E
não
era
com
grandes
equipamentos
ópticos
ou
poderosos radiotelescópios
que
eles faziam
esse
estudo.
Era observando o
céu, de
maneira
simples,
porém requintada;
algo
que estamos
aptos a
fazer
quando quisermos. Ficou
claro dessa
maneira
que,
por
mais
estranho
que possa
parecer,
crenças do
tipo promoveram de
maneira
tão
gloriosa a
astronomia.
A
astrologia podia
ser considerada uma
ciência
para a
época citada no
texto.
Isto é, Há 2000
anos
seus procedimentos e
hipóteses eram
aceitáveis, levando
em
conta o
estágio de
desenvolvimento
científico da
sociedade naquele
momento.
Supor uma
influência
desconhecida daqueles
astros
que de
noite
nos banhavam
com
tanta
suntuosidade
não é
mais
absurdo
que a
teoria dos
quatro
elementos
aristotélica,
mas
nem
por
isso vamos
deixar de
reconhecer a
importância de Aristóteles
para a
evolução do
pensamento
ou da
astrologia
para a
astronomia. A
ciência mudou
muito
desde
então,
principalmente
após os
trabalhos de
Newton.
Com os
seus e
outros
modelos
mais
recentes
que descrevem as
partes do
nosso
universo a
astrologia perdeu de
vez
sua
importância
científica, uma
vez
que todas
suas
hipóteses foram
definitivamente
derrubadas. A
lei da
gravitação
nos
mostra
que a
influência
gravitacional de uma
estrela
distante
não é
maior do
que aquela exercida
sobre
nós
pela
pessoa
que está ao
nosso
lado.
Mas
não é
simplesmente
isso,
centenas de outras
descobertas
nos mostraram a impossibilidade daquelas antigas
idéias.
Entretanto
atualmente a
astrologia continua
bastante praticada e difundida (na
verdade é uma pseudo-astrologia, falaremos
mais
sobre
isso
adiante),
inclusive
em
modalidades
em
que
aqueles
quatro
elementos possuem
papel
essencial!
Como
isso
não condiz
com a
ciência
atual a
astrologia
hoje é considerada uma pseudociência,
isto é,
um
conjunto de
teorias,
métodos e afirmações
com
aparência
científica,
mas
que partem de
premissas falsas e
que
não usam
métodos
rigorosos de
estudo.
A Eclíptica e o Zodíaco
Sabemos
que a
cada
ano a
Terra
completa uma
volta ao
redor do
Sol.
Esse
movimento
orbital da
Terra define no
espaço
um
plano o
qual damos o
nome de “eclíptica”.
Observe a
figura
abaixo. Nela podemos
perceber o
plano
eclíptico
definido
pela
Terra e
pelo
Sol (que estão
obviamente desenhados
fora de
escala!). Observe
também
que o
eixo de
rotação da
Terra está
um
pouco inclinado
em
relação à
eclíptica. Essa
inclinação de 23.5°
que é
responsável pelas
estações do
ano!

A
órbita da
maioria dos
planetas
também se dá aproximadamente nesse
plano. Uma
exceção,
por
exemplo, é
Plutão,
cujo
plano
orbital está desviado
em 17° da
eclíptica.
Tente
visualizar
agora a
seguinte
situação:
Quando anoitece e olhamos
para o
céu observamos
estrelas
em todas as
direções.
Entre o
amanhecer e o
crepúsculo o
Sol estava no
céu, realizando
seu
movimento
aparente de
leste
para
oeste –
esse
trajeto do
Sol
pelo
céu se dá numa
faixa
específica. Imagine
agora
que o
Sol
não
nos ofuscasse e
que
mesmo de
dia conseguíssemos
enxergar as
estrelas. Dessa
maneira notaríamos
que “escondidas”
por
trás do
Sol estariam algumas
estrelas pertencentes a alguma
constelação. Essas
constelações
que ficam
entre
nós e o
Sol
são conhecidas
como
constelações do
zodíaco! Veja essa
figura:
A
linha
alaranjada
que está ligando a
Terra ao
Sol atingirá alguma
constelação do
zodíaco.
Alguns meses
depois,
quando a
Terra estiver
em
outra
posição de
sua
órbita, o
Sol estará
em
frente a
outra
constelação zodiacal
diferente.
A
tabela
abaixo
lista a
época
em
que
cada
constelação do
zodíaco estará oculta
por
trás do
Sol.
Por
exemplo, se a
figura representasse a
Terra
em
sua
posição
orbital no
dia 7 de
setembro, a
seta
alaranjada atingiria a
constelação de
Leão.
Isso significa
que na
noite do
aniversário da
nossa proclamação da
independência
certamente
não veríamos o Leão, pois a noite se dá na metade
da Terra que não está voltada para o Sol (ou seja, não está voltada para a
constelação de Leão)
Constelação |
Período |
Peixes |
12
março – 18
abril |
Áries |
18
abril – 14
maio |
Touro |
14
maio – 21
junho |
Gêmeos |
21
junho – 20
julho |
Câncer |
20
julho – 10
agosto |
Leão |
10
agosto – 16
setembro |
Virgem |
16
setembro – 31
outubro |
Libra |
31
outubro – 23
novembro |
Escorpião |
23
novembro – 29
novembro |
Ofiúco |
29
novembro – 18
dezembro |
Sagitário |
18
dezembro – 19
janeiro |
Capricórnio |
19
janeiro – 16
fevereiro |
Aquário |
16
fevereiro – 12
março |
E
qual seria o melhor mês
para
ver
cada uma dessas
constelações? A
melhor
época seria
seis meses
depois (ou
antes, o
que dá na
mesma) dos
dias indicados! O
porquê fica
como
desafio!
Certamente
quem
foi
atento
notou
que
temos 13
constelações
na
nossa
tabela
do zodíaco, cujas datas são diferentes do zodíaco clássico. Acontece
que
por
motivos
históricos
o
zodíaco
clássico
só
possui 12
constelações.
O
zodíaco
ocidental
(como
a
maioria
dos
outros)
teve
sua
origem
há
mais
de 2000
anos!
Existe
um
fenômeno
conhecido
como
precessão dos
equinócios
que
é variação da
direção
do
eixo
de
rotação
da
Terra
com
o
passar
dos
anos;
esse
acontecimento
faz
com
que
o
nosso
zodíaco
seja
ligeiramente
diferente
do
zodíaco
antigo.
Mesmo
assim,
preservando o
registro
tradicional, dizemos
que
existem
apenas
12
constelações
do
zodíaco
e
que
a
constelação
de Ofíuco está de
fora.
Observando as Constelações
do Zodíaco
Olhando a
tabela
acima podemos
estimar
quais
constelações do
zodíaco estarão
visíveis
durante a
noite. Sabemos
que o
dia possui vinte e
quatro
horas, façamos
então a
seguinte
aproximação: vamos
supor
que temos 12
horas de
escuridão e 12
horas de
claridade (desde o
Sol
nascer,
ás 6:00
horas da
manhã
até o
sol se
por, às 18:00
horas da
noite). É
óbvio
que
enquanto está
claro
não podemos
observar
estrela alguma (além
do
Sol!), vamos
então
nos
preocupar
com a
outra
metade - a
noite.
Meia-noite,
por
exemplo, temos
acesso a
metade da
esfera
celeste (a
metade
que está no
sentido
oposto ao da
seta
alaranjada naquela
figura), devemos
então
ser
capazes de
observar aproximadamente
metade das
constelações zodiacais nessa
hora.
Vamos
verificar!
Vimos
que no
início de
setembro a
constelação de
Leão está oculta
por
trás do
Sol.
Então
certamente
Aquário estará
visível de
noite no
céu (Aquário
corresponde ao
início de
março,
seis meses
após
setembro).
Como o
céu a
cada
hora
nos oferece
quase 180° de
visibilidade vamos
enxergar outras
constelações do
zodíaco. Consideremos as
três
constelações
que antecedem
Aquário e as
três
que a sucedem.
Assim montamos
nossa
lista de
constelações da
meia
noite do
início de
setembro:
Ofíuco,
Sagitário,
Capricórnio,
Aquário,
Peixes,
Áries,
Touro.
Isso
vale
para
meia
noite.
Como o
Sol se põe às 18:00
horas (e
junto se põe a
constelação de
Leão,
que
como sabemos está “escondida”
pelo
Sol),
assim
que
escurecer a
constelação
que sucede
Leão deve
ser
visível à
oeste. Da
mesma
forma,
como o
Sol nasce aproximadamente às 6:00
horas da
manhã (e
junto nasce
Leão),
um
pouco
antes do
amanhecer a
constelação
que antecede
Leão deverá
ser
visível à
leste.
Claro
que
isso é uma
aproximação - os
horários do
amanhecer e do
entardecer variam
durante o
ano e
mesmo
depois do
Sol se
por (e
antes dele
nascer) existe
claridade no
céu,
que dificulta a
observação.
Para
efeito de comparação observe os
seguintes
mapas. O
primeiro corresponde à
porção
leste do
céu e o
segundo à
oeste,
exatamente à
meia-noite no
início de
setembro.

À
leste temos cruzando a
linha
cinza (que corresponde
à
eclíptica):
Aquário,
Peixes,
Áries e
Touro (já nascendo)
À
oeste: Ofiúco,
Sagitário,
Capricórnio e
Aquário.
Afinal das
contas
nossa
estimativa estava
excelente!
Agora
só
nos
resta
divertir
um
pouco
com essas
idéias e
repetir a
brincadeira
em
qualquer
época do
ano!
|